terça-feira, 8 de junho de 2010

Os primeiros versos

Com uma cerveja na mão esquerda e um punhado de nostalgias na direita, andei por caminhos que há tempos eu não andava. A estrada era de sinuosas curvas e placas um tanto confusas; ora indicavam cidades, ora nomes de colegas do primário. Inspirado pela gelada noite de segunda-feira, fui longe nesse caminho de memórias envoltas em tanta neblina. Lá pelas tantas, sem querer, tropecei num dos ‘primeiros’ da minha vida.

No caso, era a primeira paixão. Mas como é brega demais e clichê em demasia falar da primeira paixão, falo mais do que veio colado nela: os primeiro versos.

Se hoje eu tento com duvidosa determinação e certo fracasso ser um escritor amador, é porque na minha primeira paixão eu inventei que tinha de escrever um verso de amor, os primeiros versos de amor.
Eram versos singelos como a maioria dos corações pré-adolescentes, recheados de implícitos temores e desejos que só são compreensíveis quando se é pré-adolescente. Ninguém mais entende, não adianta insistir.



Aquela garota é tão bela / Que eu até fico louco por ela. / Por ela eu sinto uma paixão, / Pois parei de pensar com o cérebro/ E pensei com o coração. / Não sei ao certo se estou amando, / Mas sei que estou me apaixonando, / E é por você...

Pois é. Eram bobos assim mesmo. Por algum motivo eu ainda me recordo com exatidão das rimas – pobres e previsíveis, mas olhe lá, eram rimas...

Talvez eu me recorde porque ensaiei, metodicamente, quase diariamente, declarar-me com essa mini-poesia.

Declarar... acho que nunca mais usei esse verbo nessa situação desde minha sétima série; dá pra imaginar você, barbado, ‘se declarando’ para alguém? É tipo dizer que você ‘gosta’ da pessoa; você só pode gostar até certa idade, depois o verbo muda. Vai ver verbo também tem pré-adolescencia, se apaixona, se dana, aí vem a adolescencia, se apaixona e se dana de novo, e aí vira adulto pra se apaixonar e se danar novamente... Enfim, a questão é que nesse processo o verbo muda.

Bem, eu ia, mesmo, recitar os versos cara a cara com a garota. Afinal ela era a dona de minhas rimas, de minha inspiração e do meu o afeto desmedido de quem tem só 13 anos. Mas por sorte ter 13 anos implica um monte de coisas; além da inexperiência, da falta de bom senso, e de um certo lirismo já exagerado quando se trata de paixonites, ter 13 anos implicava – para mim ao menos – ser tímido, horrivelmente tímido.

Timidez de corar só de olhar nos olhos da garotinha. Que dizer então dos meus planos românticos de pegar nas mãos dela, encará-la serenamente, fazer uma voz rouca e segura (algo peculiarmente difícil quando se tem 13 anos e tua voz é desesperadamente desafinada ao sabor dos hormônios)? Só em sonhos mesmo.

Então nunca recitei nem me declarei. 

Mas não lamento - e não só pela vergonha poupada. Se eu tivesse me declarado, talvez, vai saber?, eu nunca teria insistido em outros versos nem teria buscado rimas para palavras diferentes. Não que hoje eu faça rimas sensacionais ou capte com maestria os dissabores da alma humana; mas, como dizem os otimistas, uma decepção ensina mais que um sucesso.

Vai ver isso cole também para os nossos eus líricos... Tantos caminhos de tantas placas, em tamanha neblina, devem ir mais longe, e fundo, nas ausências do que nas presenças.

Mas isso já vai além da primeira paixão, dos primeiros versos e muito além da cerveja, que não resta nem um último gole. Só a nostalgia resta. Ah, essa sempre resta.

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