quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Dia das Crianças, parque e promessas.

Caminhando no parque, dando voltas e voltas numa pista de concreto que circunda um lago, dentre bosques e pontes e gramados, as pessoas se esbarram pela estreiteza da pista; não esbarrões físicos e truncados. Não, é um esbarrão de outro tipo.

O que acontece é que pessoas, feito universos de diferentes lógicas e leis, por um segundo - bem naquele preciso segundo que comporta lado a lado o que vai e o que vem, o ponto de encontro do sentido horário com o anti-horário - se encontram, colidem em um nível imaginário, e tomam conhecimento uns dos outros. Olhar nos olhos, cumprimentar, prestar atenção de verdade ou não, ignorar com toda a prerrogativa de suas individualidades; as reações são várias. Mas o que acontece é que vidas alheias chegam a ouvidos alheios, e sem nunca encerrar por completo o sentido desta descoberta. Afinal, as pessoas, feito universos, são coisas de medidas nunca precisas.

***

Completamente cobertos pelas sombras das árvores, exatamente na parte mais afastada e por isso mais tranquila da pista de caminhada, os dois traziam um quê de solidão nos ombros. Caminhavam lado a lado, de mãos dadas, lentos, sem pressa; ele já trazendo uma insidiosa calvície dentre os cabelos parcialmente grisalhos, enquanto ela trazia, no máximo, seus 7 anos – ou menos? - e um vestidinho rosa combinando com fita vermelha amarrada em laço no pulso . Resquício daquele Dia das da Crianças, na certa.

Vistos de longe, pareciam não mover as bocas. Traziam juntos o silêncio – que tal qual a solidão, parecia maior no lado dele - e parecia ser um silêncio em suspenso, daqueles que pairam feito nuvem de chuva e cedo ou tarde há de desmanchar terra abaixo. Depois de tomar folego, é ele quem dá os primeiros pingos:

- Mas eu vou cuidar de você, tá bom? Mesmo só nós dois, o papai cuida de você, tá?

A menininha prosseguiu seus passos lentos. Guiada pela mão do pai que gentilmente segurava a sua, não disse nada. Porém, com a boca entreaberta, aqueles olhinhos vivos e úmidos matutavam alguma coisa, reagiam àquela singela promessa. Então, como se tivesse sofrido de um pequeno atraso no processamento das informações e elas surgissem assim, de supetão, num sobressalto ela levantou a cabeça com toda decisão.

- E eu cuido de você também, pai!

Corajosa, ela não quis ficar fora das promessas. Como para selar o pacto, usou então das duas mãos, suas diminutas mãos, para segurar a do pai.

As árvores à beira da pista continuavam a fazer uma só sombra, densa e pacata, enquanto os dois continuaram caminhando pelo parque; iam agora num silêncio não tão suspenso, pois os primeiros pingos da esperada chuva já se faziam sentir. A chuva que lhes levaria embora a solidão.

Um comentário:

  1. César, o segundo parágrafo ficou perfeito. Eu não tenho nem como retrucar!


    *-*

    "Afinal, as pessoas, feito universos, são coisas de medidas nunca precisas."


    Não caberia também dizer que "medidas são coisas que nem as pessoas, nem todo o universo podem, numa regra geral e absoluta, precisar ao certo?"



    saudades de você.

    =)

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